Ciao “REGA’, come ve butta? (Olá malta, como estão?)
Hoje quero contar-vos algumas lendas de Roma: as Estátuas Falantes.
Quando temos de ir ao centro de Roma, como em qualquer outra metrópole, pensamos logo no trânsito, na dificuldade de encontrar estacionamento ou nos transportes públicos atrasados e desconfortáveis.
O instinto do cidadão faz-nos antecipar a ansiedade de ter de contornar bairros inteiros, atravessar “sete colinas” de engarrafamentos e enfrentar enxames de vendedores ambulantes e lavadores de para-brisas…
Nós, romanos, imaginamos Roma assim: bela, sim, mas inacessível. E o mesmo acontece convosco, turistas que vêm visitar a “Cidade Eterna”.
Na realidade, não é bem assim.
Roma não é necessariamente como os estereótipos populares a pintam.
Vamos dar um passeio pelo centro, talvez ao anoitecer, sem pressa e sem compromissos inadiáveis. Se estivermos dispostos a abrandar o passo e a aguçar os sentidos, veremos Roma de outra forma.
Deixará de ser apenas uma cidade caótica e frenética e tornar-se-á um ser vivo e pulsante, repleto de fascínio e mistério, pronto a revelar histórias antigas e episódios obscuros do passado.
História e folclore, crónicas e lendas misturam-se no caldeirão do tempo, oferecendo-nos um manancial de acontecimentos e tradições para degustar, sentados num banco de jardim, sob a luz de um candeeiro ou no meio de uma praça.
Vamos então escutar o que Roma tem para nos contar.
A lenda das Estátuas Falantes e a estátua de Pasquino
Mas quem foi este Pasquino, tantas vezes mencionado nos livros de história? Hoje vamos descobrir.
Para ver Pasquino, basta ir até à Piazza di Pasquino, onde a estátua está sobre um pedestal a cerca de um metro e oitenta de altura. Trata-se do que resta de um grupo escultórico que, muito provavelmente, decorava o antigo Stadio di Domiziano.
É apenas um fragmento de pedra, mas para termos uma ideia da sua composição original, basta visitar a Piazza della Signoria, em Florença, e admirar, na Loggia dei Lanzi, o grupo de mármore Patroclo e Menelao.
Voltando a Roma, esta escultura foi desenterrada em 1501, durante as escavações para a renovação das ruas junto ao Palazzo Orsini (hoje Palazzo Braschi). Já estava em péssimo estado de conservação, e muitos a consideravam sem valor, mas o Cardinale Carafa insistiu em preservá-la e colocá-la no local onde permanece até hoje.
Talvez devido ao pouco sentido estético do povo romano ou, mais provavelmente, ao seu estado já degradado, a estátua foi muitas vezes vandalizada e alvo de ataques com pedras.
Por que se chama Pasquino?
A origem do nome é incerta.
Segundo alguns, Pasquino era um taberneiro da praça, cujo nome acabou por passar para a estátua e tornar-se um “topónimo”. Outros dizem que era um barbeiro ou um cantor popular da zona.
No entanto, a versão mais difundida identifica Pasquino como um professor de gramática, provavelmente tão feio como a estátua e pouco querido pelos seus alunos. Estes costumavam colar versos satíricos na escultura para zombar do “prof”.
Com o tempo, as zombarias desapareceram, mas o nome ficou ligado à estátua, assim como o costume de afixar versos críticos. Inicialmente, os alvos eram apenas os habitantes do bairro, mas depois as críticas passaram a visar membros da nobreza e até altos dignitários da Igreja.
Os papas tentaram reprimir este costume, ordenando patrulhas e guardas armados, mas nada impediu os romanos de continuar a ridicularizar os poderosos da época. Pasquino já não era apenas uma estátua de mármore em ruínas; tinha-se tornado um símbolo de resistência e liberdade de expressão popular.
Diga-se, no entanto, que muitas das pasquinate não eram apenas obra de cidadãos descontentes, mas também de poetas pagos por famílias aristocráticas para difamar rivais e incitar o descontentamento popular.
Il Congresso degli Arguti
Devido à forte vigilância da guarda papal e à censura, as pasquinate começaram a espalhar-se por outras estátuas da cidade.
Quando Pasquino fazia uma sátira, outra estátua respondia com mais ironia e uma terceira entrava no debate. Assim nasceu o Congresso degli Arguti, o círculo das Estátuas Falantes de Roma.
As Estátuas Falantes são:
- Pasquino: O mais famoso, na Piazza di Pasquino, a poucos metros da Piazza Navona. Ainda hoje aparecem versos e mensagens criticando injustiças sociais e políticas.
- Marforio: A maior do grupo, representa o deus Oceano reclinado. Está no Museo Capitolino e era o interlocutor habitual de Pasquino.
- Uma das trocas de versos mais conhecidas foi:
- Marforio a Pasquino: “É verdade que os franceses são todos ladrões?”
- Pasquino: “Todos não, mas BonaParte!” (trocadilho com Napoleão Bonaparte, sugerindo que “uma boa parte” deles sim).
- Abate Luigi: Uma estátua de um homem de toga, possivelmente um senador romano. Encontra-se na Piazza Vidoni e já foi várias vezes decapitada. Em 1966, alguém escreveu um poema satírico:
- “Ó tu que me roubaste a cabeça, vê se a trazes de volta imediatamente, senão, queres ver? Como se nada fosse, mandam-me para o Governo. E isso incomoda-me.”
Desde 2013, a estátua continua sem cabeça.
- “Ó tu que me roubaste a cabeça, vê se a trazes de volta imediatamente, senão, queres ver? Como se nada fosse, mandam-me para o Governo. E isso incomoda-me.”
- Madama Lucrezia: Um enorme busto de mármore na Piazza San Marco. Acredita-se que represente a deusa Ísis ou uma sacerdotisa. O nome vem de Lucrezia d’Alagno, amante de Alfonso V d’Aragona. Durante os tumultos de 1799, o busto foi derrubado e surgiu um cartaz com a frase:
- “Non ne posso veder più” (Não posso ver mais nada).
- Il Facchino: Uma pequena fonte na Via Lata, representando um homem com um barril de água. Devido à sua fisionomia, foi erradamente identificado como um “carregador” de mercadorias, quando na verdade era um vendedor de água.
- Il Babuino: Na Via del Babuino, é uma outra fonte falante. Atrás dela, há um café muito peculiar, onde se pode beber rodeado de esculturas e moldes de gesso, uma experiência única para os amantes da arte.
Roma é assim: uma cidade onde arte, história e sátira se entrelaçam há séculos, deixando marcas profundas no coração dos seus habitantes e visitantes.
Se vedemo alla prossima, rega’! (Vemo-nos na próxima, malta!)
Gigi